terça-feira, 26 de maio de 2020

Um relato de quarentena

A quarentena tem me feito internalizar coisas que não imaginava. Gostaria de fazer um relato.

Eu sempre disse que preferia ter me formado na escola onde cursei até os 13 anos, até ir para uma escola técnica, onde cursei o ensino médio e carrego lembranças dolorosas. Agora percebo tamanha estupidez no meu ponto. O problema não era onde eu estava, o problema era eu. Por tantos e tantos anos, me vitimizei por configuração social e acontecimentos inerentes a mim que não percebi o quanto justamente todo o furacão estava dentro de mim e isso não era motivo pra deixar ele me arrastar.

Fato é que eu tinha uma vida perfeita pra desenvolver problemas psicológicos e não me culpo por isso. Pra falar a verdade, hoje não me culpo mais por nada. Acho que entender a origem dos seus problemas, sobretudo a origem socioeconômico-familiar, é um momento crucial pra sua vida, pra se aceitar e permitir, mas nem de longe é marco pra carregar como norte. Como assim? A vida é cruel, sim, vivemos desilusões, vemos coisas melhores nas mãos de piores, vemos injustiças com nossa própria pessoa...

Só que, veja bem, é óbvio que vamos perceber sozinhos as injustiças que sofremos! Se não prestar atenção na minha própria vida, vou prestar em qual? Claro que isso não significa engolir calado o que há de errado, é mais uma forma de ver que, ok, a vida vai me deixar pra baixo, mas preciso da minha revolta também, da minha sede, da minha vontade de vencer, não da minha ansiedade, da minha indiferença, da minha desistência.

Nunca terei força pra mudar o mundo se minha única atitude for dizer que o mundo precisa ser mudado. Eu preciso agir, preciso andar, engajar, chamar, gritar, correr! A partir do momento que tenho a consciência social da minha própria vida, eu tenho o poder de deixar de ser vítima e lutar contra o sistema, porque o sistema nos quer mudos, cegos, estáticos, inoperantes, e eu passo a saber que é isso o que não vou ser.

Não é o velho papo coach de seja o que quer ser, é o "perceba o que gera a sua dor, mas faça que isso te deixe mais forte pra acabar com o que a gera". E isso às vezes demora. Às vezes demora muito. Demora tempo suficiente pra agonizar com o sentimento de incapacidade e medo, mas passa. Passa e você percebe como é injusto se deixar levar como vítima enquanto você tem conhecimento e vontade pra derrubar o opressor. E é assim como eu me sinto.

Me sinto renovado por tanto pensar que me privei de correr atrás de mim por aceitar que as coisas não eram pra mim. E não é "eu poderia ser muito mais do que sou", mas "eu posso ser muito mais do que sou". O 'poderia' é futuro do pretérito, que não é um tempo verbal que vale a pena para orientar a vida. A vida funciona melhor no presente. E cada lição sobre o passado é uma margem para o futuro. A vida não é conexa, linear, enfim, não existe "manual das pessoas". E sobre isso eu mesmo me falava lá atrás.

Agora? Agora tenho um gás diferente, contente por poder aproveitar da melhor forma o pior momento: a quarentena. Que venham avanços.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Saudade de você

Me perdoe, sou dramático. Ouça Baby Consuelo dizendo "não chore, meu amor, não chore" e faça disso minha súplica: não chore.

Me perdoe pelas ausências também; somos tão próximos, estamos tão distantes. Não sei qual seria o melhor discurso agora, é o momento em que venho com o rabo entre as pernas, não é mesmo? Recolho-me a ti porque somos carne e unha, alma gêmea. Lembra aquele dia no karaokê? Nos divertimos bastante: sexo, álcool e rock n roll! Lembro até que fumávamos.

Aquele dia na praça Roosevelt então? Ainda mais disso! E essas lágrimas são de felicidade. Dói o coração nosso desencontro, nossa disritmia, nosso compasso distinto. Tem horas que nos encontramos, acredito que sim; tem horas que eu quero te ver, mas não vejo. Você não volta, né? Isso machuca em alguns momentos. A vida não é bem aquele filme em que eu supunha ser protagonista. Disso você lembra né? Acho que foi ideia sua.

Quando aperta, que aperta de verdade, eu olho no espelho e fico te procurando, como que te esperando. Olho no fundo dos meus olhos, afinal, você deveria estar lá. Me falta tua compaixão, tua criatividade, teu jeito tão legal de dizer "vai ficar tudo bem". Você não falava sobre ansiedade, depressão, sobre desilusão amorosa... você era o próprio amor. Tanta compaixão, carinho, ternura, teu jeito era a coisa mais agradável do mundo. Onde você se meteu? Me diz que eu busco.

Me diz que eu busco.

Você tinha solução pra tudo, não tinha um pingo de maldade no coração, um pingo! A maldade que você tinha era essa característica efêmera. Que droga! Você está dentro de mim, quero te atingir, quero te alcançar! Você é a parte mais bonita de toda essa história e nem sequer deixa rastros. Hoje tive aula sobre meditação, tenho certeza que em algum momento você passou por lá. 

Se te roubaram, me desculpa, não foi minha culpa. Eu tenho muita culpa, mesmo que odeie me fazer de vítima (e faça), mas isso não foi minha culpa. Todos esses duros momentos têm me mostrado o que eu já sabia: sou forte, aguento firme à beça. Só que não estou interessado em mais provações, não estou interessado em mais dificuldades pra saciar meus piores pesadelos, não estou interessado nessa ideia egoísta de saber que sou forte. O que quero é você comigo, pra nunca mais nos separarmos.

O mundo é cruel, mas ainda mais cruel é essa insensatez da vida sem a parte mais nobre da minha existência: você. Você sou eu. Sou eu há anos atrás, sou eu numa versão tão diferente, tão dócil. A culpa pode ser do capitalismo, da sociedade, das atrocidades da própria sociedade, eu não sei e nem quero saber quem é o culpado. Hoje tenho consciência, hoje tenho percepção de mundo, hoje eu sinto falta de você. Você é o Denis que estaria abraçando e não o que está sentindo falta de abraço. Me dê uma dica, uma pista, insista.

Eu queria ser você de novo.