segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Quarentena

Parece que 2020 é uma busca por verdades, por razões, pelo próprio eu. O confinamento, ao menos pra alguns, é o confronto direto com o eu. E nada pode ser mais assustador que se defrontar com seus pesadelos e, principalmente, com seus sonhos e ideais. Ter fugido de si mesmo ou do que se imaginava pra si num momento em que somente o que conta é sua própria companhia é o verdadeiro desafio: assimilar a discrepância dos "eu não" e "eu nunca" que viraram realidade.

Todas aquelas noções, de amizade, de carreira, de família, de relacionamento, tudo isso se mistura num grande caldeirão. Num caldeirão que o ato de meditar organiza, qualifica, tipifica, mas não resolve. Você consegue transformar boa parte do que enche sua mente, e isso até ajuda bastante, mas a pulga atrás da orelha vai continuar, os verdadeiros problemas, as verdadeiras indagações não vão fugir por você colocá-los em seus devidos lugares.

Não sou devoto da ciência, sou apenas... cientista. Eu posso idealizar um método, definir uma métrica de quanto uma dor dói, mas não consigo encontrar um conceito definitivo do que é dor. Assim como não posso fazer isso em relação ao amor. Mas é nessa antítese de amor-dor que reside grande parte das nossas escolhas, dos nossos guias, nossos Nortes. E aí entram os paradoxos: existe ciência pras nossas escolhas e guias, mas a essência do que os faz não comporta ciência em sua forma mais pura. É um jogo ardiloso que não tem uma única resposta certa. Isso é desesperador.

Sinto falta dos meus amigos. Tudo que escrevi sobre cada um deles é verdade.


terça-feira, 26 de maio de 2020

Um relato de quarentena

A quarentena tem me feito internalizar coisas que não imaginava. Gostaria de fazer um relato.

Eu sempre disse que preferia ter me formado na escola onde cursei até os 13 anos, até ir para uma escola técnica, onde cursei o ensino médio e carrego lembranças dolorosas. Agora percebo tamanha estupidez no meu ponto. O problema não era onde eu estava, o problema era eu. Por tantos e tantos anos, me vitimizei por configuração social e acontecimentos inerentes a mim que não percebi o quanto justamente todo o furacão estava dentro de mim e isso não era motivo pra deixar ele me arrastar.

Fato é que eu tinha uma vida perfeita pra desenvolver problemas psicológicos e não me culpo por isso. Pra falar a verdade, hoje não me culpo mais por nada. Acho que entender a origem dos seus problemas, sobretudo a origem socioeconômico-familiar, é um momento crucial pra sua vida, pra se aceitar e permitir, mas nem de longe é marco pra carregar como norte. Como assim? A vida é cruel, sim, vivemos desilusões, vemos coisas melhores nas mãos de piores, vemos injustiças com nossa própria pessoa...

Só que, veja bem, é óbvio que vamos perceber sozinhos as injustiças que sofremos! Se não prestar atenção na minha própria vida, vou prestar em qual? Claro que isso não significa engolir calado o que há de errado, é mais uma forma de ver que, ok, a vida vai me deixar pra baixo, mas preciso da minha revolta também, da minha sede, da minha vontade de vencer, não da minha ansiedade, da minha indiferença, da minha desistência.

Nunca terei força pra mudar o mundo se minha única atitude for dizer que o mundo precisa ser mudado. Eu preciso agir, preciso andar, engajar, chamar, gritar, correr! A partir do momento que tenho a consciência social da minha própria vida, eu tenho o poder de deixar de ser vítima e lutar contra o sistema, porque o sistema nos quer mudos, cegos, estáticos, inoperantes, e eu passo a saber que é isso o que não vou ser.

Não é o velho papo coach de seja o que quer ser, é o "perceba o que gera a sua dor, mas faça que isso te deixe mais forte pra acabar com o que a gera". E isso às vezes demora. Às vezes demora muito. Demora tempo suficiente pra agonizar com o sentimento de incapacidade e medo, mas passa. Passa e você percebe como é injusto se deixar levar como vítima enquanto você tem conhecimento e vontade pra derrubar o opressor. E é assim como eu me sinto.

Me sinto renovado por tanto pensar que me privei de correr atrás de mim por aceitar que as coisas não eram pra mim. E não é "eu poderia ser muito mais do que sou", mas "eu posso ser muito mais do que sou". O 'poderia' é futuro do pretérito, que não é um tempo verbal que vale a pena para orientar a vida. A vida funciona melhor no presente. E cada lição sobre o passado é uma margem para o futuro. A vida não é conexa, linear, enfim, não existe "manual das pessoas". E sobre isso eu mesmo me falava lá atrás.

Agora? Agora tenho um gás diferente, contente por poder aproveitar da melhor forma o pior momento: a quarentena. Que venham avanços.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Saudade de você

Me perdoe, sou dramático. Ouça Baby Consuelo dizendo "não chore, meu amor, não chore" e faça disso minha súplica: não chore.

Me perdoe pelas ausências também; somos tão próximos, estamos tão distantes. Não sei qual seria o melhor discurso agora, é o momento em que venho com o rabo entre as pernas, não é mesmo? Recolho-me a ti porque somos carne e unha, alma gêmea. Lembra aquele dia no karaokê? Nos divertimos bastante: sexo, álcool e rock n roll! Lembro até que fumávamos.

Aquele dia na praça Roosevelt então? Ainda mais disso! E essas lágrimas são de felicidade. Dói o coração nosso desencontro, nossa disritmia, nosso compasso distinto. Tem horas que nos encontramos, acredito que sim; tem horas que eu quero te ver, mas não vejo. Você não volta, né? Isso machuca em alguns momentos. A vida não é bem aquele filme em que eu supunha ser protagonista. Disso você lembra né? Acho que foi ideia sua.

Quando aperta, que aperta de verdade, eu olho no espelho e fico te procurando, como que te esperando. Olho no fundo dos meus olhos, afinal, você deveria estar lá. Me falta tua compaixão, tua criatividade, teu jeito tão legal de dizer "vai ficar tudo bem". Você não falava sobre ansiedade, depressão, sobre desilusão amorosa... você era o próprio amor. Tanta compaixão, carinho, ternura, teu jeito era a coisa mais agradável do mundo. Onde você se meteu? Me diz que eu busco.

Me diz que eu busco.

Você tinha solução pra tudo, não tinha um pingo de maldade no coração, um pingo! A maldade que você tinha era essa característica efêmera. Que droga! Você está dentro de mim, quero te atingir, quero te alcançar! Você é a parte mais bonita de toda essa história e nem sequer deixa rastros. Hoje tive aula sobre meditação, tenho certeza que em algum momento você passou por lá. 

Se te roubaram, me desculpa, não foi minha culpa. Eu tenho muita culpa, mesmo que odeie me fazer de vítima (e faça), mas isso não foi minha culpa. Todos esses duros momentos têm me mostrado o que eu já sabia: sou forte, aguento firme à beça. Só que não estou interessado em mais provações, não estou interessado em mais dificuldades pra saciar meus piores pesadelos, não estou interessado nessa ideia egoísta de saber que sou forte. O que quero é você comigo, pra nunca mais nos separarmos.

O mundo é cruel, mas ainda mais cruel é essa insensatez da vida sem a parte mais nobre da minha existência: você. Você sou eu. Sou eu há anos atrás, sou eu numa versão tão diferente, tão dócil. A culpa pode ser do capitalismo, da sociedade, das atrocidades da própria sociedade, eu não sei e nem quero saber quem é o culpado. Hoje tenho consciência, hoje tenho percepção de mundo, hoje eu sinto falta de você. Você é o Denis que estaria abraçando e não o que está sentindo falta de abraço. Me dê uma dica, uma pista, insista.

Eu queria ser você de novo.

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Como sou

Eu só tive uma paixão verdadeiramente correspondida. Não à toa, quase casamos. Ela era divertida, embora tivéssemos nossos problemas. Sinto saudades dela sim. Saudades saudáveis.

De certa forma, me considero hoje uma grande farsa. Sou péssimo filho; como irmão, praticamente não sou irmão; como par, um errante; como matemático, bem abaixo da média; como amigo, deixo a desejar exceto pra três ou quatro pessoas. Em resumo, sou um desnecessário.

Me considero uma pessoa muito sociável, adoro ter minha voz sendo ouvida e meu rosto sendo visto por todos, mas tem horas que gostaria de ser um fantasma e passar despercebido... completamente despercebido. E essas horas são muitas, em suma, sou bem desprezível, também por isso.

Como filho, que é a primeira coisa que citei, eu não sei, acho que abstraí demais o conceito de família. Errado? Vai falar isso pra um jovem que passou a adolescência sozinho, tendo contato no máximo com pessoas de fora da "família". Não é nem vitimismo, é conformismo. Eu aceito minha condição.

Como irmão, cabe bem uma risada aqui. Das boas. Se abstraí o conceito de família na adolescência, isso foi por conta de ter dois irmãos e ao mesmo tempo não ter. Eu sei, eu era difícil, mas a casca era fina. Depois quebrei ela, mas infelizmente de dentro pra fora. Se fosse de fora pra dentro, hoje em dia, eu nem escreveria este parágrafo, acho que nem mesmo este texto.

Como par, é riso ou é choro. Sou como um bingo - tive uma grande paixão recentemente, maior que todas as outras, mesmo sem ter sido nada, mas tive tantas não-paixões, que é até frustrante pensar nas vezes que deixei ir porque não estava afim de ir junto. Minha paixão correspondida não foi assim: não foi essa grande paixão, mas também não foi dessas que se deixa ir - foi na medida. E essa medida foi eterna enquanto durou.

Digo que sinto saudades. É claro que sinto! Quem não sentiria?! Éramos toda a conjugação de um verbo difícil de conjugar, um verdadeiro filme premiado no festival de Cannes. O que isso quer dizer? Não sei, mas não é pouco. Carrego a saudade do que foi vivido (e já acabou), do que era lindo, meigo, colorido e que, embora tenha morrido, revitalizava. Não sou injusto com a minha memória, nem com os aprendizados do meu coração: amei de verdade.

Como matemático, poxa vida, sei um pouquinho bem pouquinho de algumas coisas, mas tão tão pouquinho que não sei nem se dá pra diferenciar o pouquinho do nada. Eu confesso que não tenho vontade de ser especialista numa única área. Gosto muito de Análise, Probabilidade (subárea da Análise? É, sim, mas diferenciemos) tem me trazido boas ideias, Geometria eu morro de curiosidade, mas confesso que minha paixão secreta se chama Álgebra. Ah, sim, Análise Complexa é paixão assumida. Em suma, sou uma fraude também na Matemática.

Agora preciso falar de como sou amigo. Não sou bom amigo, em geral. Em casos bem particulares, sou ótimo amigo, sim. Gosto e tenho muito carinho por aqueles amigos que muitas vezes nem sentido faz serem tão amigos, mas são. O problema é que nem só de pão vive o homem. Esqueço, não falo, ignoro, sou bem imprestável com boa parte dos amigos. Estão no coração, é, estão, mas costumo prestar mais atenção nos batimentos do momento. Queria não ser assim, mas de 1993 pra cá, eu sei o que é questão de atitude e o que é questão de paciência. Paciência.

No fim, é só mais um caldeirão de palavras.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Onde minha ansiedade social me leva

Às vezes, tenho vergonha
E vergonha da vergonha
E vergonha da vergonha da vergonha.
Pelo que li, é uma ansiedade social.

São problemas minúsculos
Que gostaria de me abrir
E vou me abrindo, abrindo, abrindo...
Até perceber que ainda estou fechado.

Tem horas que arranco os cabelos,
Tem horas que choro.
É uma condição de não-sei-porque.

A vida adulta é onde vão surgindo todos aqueles problemas psicológicos que talvez a adolescência tenha encoberto com álcool e tabaco.

Você se questiona socialmente
Até compreender o seu lugar.
Você se questiona antropologicamente
Até compreender sua identidade cultural.
Você se questiona existencialmente,
Mas isso você não compreende.

Você carrega traumas e boas vivências,
Tem uma vida (pra muitos) perfeita,
Que coleciona diversos "e se eu tivesse...?" na surdina.
Aquele "e se eu tivesse...?".

O que você não tem é sossego mental,
Não tem família,
Tem uma ou duas amizades,
Em meio a inúmeras 'amizades'...

Você tem uma fábrica pra enlouquecer:
Sua vida é perfeita, você não pode reclamar,
Mas sua vida é solitária e você não tem com quem falar
E no embuste que é seu convívio virtual, você só quer se expressar.

Aí você olha pra casa daquelas pessoas
- Papai, mamãe, irmãs ou irmãos.
Que inveja, que inveja.

Chega sua vez de reclamar,
Dizem "Para com isso".
Não paro.
"Você é só um cuzão da vida perfeita."